domingo, 13 de maio de 2012

As pazes



Passei 9 ou 8 anos em Florianópolis, nunca soube fazer esta conta. Sei que fui e voltei na hora certa.

Não perguntem o porquê fui morar lá. Hoje também sei que foi uma dessas tramas do destino para que eu crescesse na raça, sem dó ou piedade e muito frio.

Passei maus bocados ali e claro que bons também. Ninguém constrói coisa alguma só com tropeços.

Há um mês, ao chega da Universidade, minha irmã avisa que havia comprado passagens para Floripa por um preço irrisório, e que assim acabava nossa sofreguidão por não saber o que fazer na semana santa.

Levei um chute no rim e fui inundada por uma ansiedade sem medida, senti medo de rever aquele lugar e pessoas que me remetiam a moradia e a saída custosa de um casulo.

Ao pisar em solo Catarinense, a primeira sensação foi o cheiro da cidade e o ar úmido me abraçando. Toda a ansiedade passou, fui tomada por uma emoção recheada de gratidão. Senti que recebia boas vindas! Respirei fundo, limpei a única lágrima que descia e agradeci com um amém.

Logo chegou meu Ex-marido ou melhor vou chama-lo de F. , ex marido é pejorativo em demasia, para nos buscar, quase desceu com o carro andando e me deu um abraço de dez anos de saudade.

Depois deste primeiro contato, o tempo de ausências se desfez como se tivéssemos nos encontrado uma hora atrás, ou melhor, nunca tivéssemos ficado um só dia sem nos falar, uma cumplicidade que as almas entendiam e os corpos ainda não.

Ao chegar na casa de minha amiga, onde ficaria hospedada, a amiga que por incontáveis vezes acalmou meu espernear dentro do casulo.

Nada de parcimônia e sim muita intimidade com a vida uma da outra, isso é porque fazia dez anos que o nossos contatos eram breves conversas em redes sociais.

Um brinde com a benção da lagoa da Conceição-como já chorei as margens daquelas águas salubres-naquele instante me exibia e sorria

A noite era coisa de amigas na boate, fiz uma maquiagem como quem pinta uma obra prima.

- Tira o salto, o taxi não sobe aqui e temos que descer a ladeira! Ouvi e ri.

Esta amiga mora em uma casa que a cortina é o sol ou chuva, a lua e a lagoa da Conceição, em uma parte alta da costa.

Amigas na boate, muito riso, bons drinks, charme, fotografia registrando tudo, pessoas diferentes para mim e pés sujos escondidos pelo salto.

F. liga avisando que não poderia ir, e sua voz clamava um vem logo, vem urgente! Respondi que tudo bem, combinaríamos algo para o dia seguinte.

Olhei para amiga e antes de perguntar algo, que respondeu pedindo um taxi .

Passei em uma loja de conveniência, enchi o carrinho de guloseimas e bebidas já sabidas, eu só não sabia o número do apartamento dele

Meu celular tinha acabado a bateria; estava o mar, um interfone com infinitas combinações ( condomínio com 125 apartamentos e 6 blocos), uma sacola enorme e muita vontade.

Desci do salto, abri uma cerveja e comecei a fazer todos os tipos de combinações, aniversário das filhas dele, ano, hora, idade...o interfone gritava e nada de resposta. Um trago, muito barulho e o sono dava sinal de vida.

Não sentia medo e seria capaz de dormir ali mesmo, quando já tinha esta como a saída da noite, ouvi passos e a voz tão esperada:

- Se eu for expulso do condomínio, vou morar na sua casa as suas custas e tenho certeza que você vai estar com os pés no chão imundo... ( a voz tinha altura, sotaque paulista e muita alegria).

- Como você sabia que eu estava aqui? – perguntei entregando o salto e sacola.

- Por que você fez só um pouquinho de barulho, quando fui a sacada ver quem era o louco que não pensa no sono do outro....Você trouxe aquele sorvete!??? Parecia que tinga visto DEUS e não o sorvete que amávamos.

Rimos de chorar, resgatamos, brigamos, choramos, cantamos, confirmamos, agradecemos, comemos tudo e dormimos brigando por espaço na cama, como sempre.

Acordei ao meio dia com o celular dele esgoelando, olhei para o lado e o fitei, senti um carinho tão profundo que o fim do nosso casamento sentou no canto daquela cama ( como fiz um dia) e respondeu :

- Existem várias formas de amar, a de vocês é atemporal e não quer dizer que tenham que ficar juntos para saber disso. Fazem parte da vida um do outro e isso é tudo!

Entendi finalmente! Poderia levantar e ir embora que se um dia o tivesse feito mal, o perdão estaria sacramentado.

Tinha mais dois dias na cidade. Acreditem no primeiro almoço eu sugeri feijoada, parecia que eu estava levando meus convidados. Na verdade era...

Outros amigos queridos foram me ver, minha amiga e eu tiramos nossa cumplicidade da gaveta do coração e areamos com eternas dialéticas, gargalhada, música alta e champagne.

O P, tinha uma suposta namorada, inventava histórias para ela e para mim, eu ria e tive que explicar quando em meio a sua desculpa interrompi falando que o amava muito.

- Enche meu copo e cala a boca ( ele consegue falar mais que eu), quando falo que te amo é a mais pura verdade, Não nos imagino casados ou namorando novamente. Para mim, este amor que talvez tenha te assustado é paixão e não é disso que estou falando, o que sinto por você é o que sinto pelos “poucos muitos” que encho a boca para falar, sagrado! Sabe?

Ele olhava como se quisesse dizer o mesmo para aquela mulher vestida com uma uma camiseta dele e que em três horas estaria voltando para casa sem data para voltar.

- Quanto a nossa química – continuei- seria óbvio, mas não estou falando disso, estou falando de ser e não te ter, agora vou dormir, pois daqui a pouco será a última chamada do voo.

Ele me puxou, deu um abraço infinito, e eu sabia que havia entendido, mas tive certeza quando tateei a cama e não o senti lá. Fui à sala, ele fitava nossos chinelos de tamanhos diferentes e modelos iguais.

- O que é isso? Perguntei sonolenta.

- Eu te amo muito também, não vou dormir não, te acordo agorinha e pode usar meu travesseiro. ( o travesseiro dele sempre foi sagrado, parecia filho).

Dei um cheiro, sorri e respondi : - Já estou usando.

- Não amo mais...gritou da sala!

No embarque, minha irmã tem uma crise de queda de pressão e fomos impedidas de embargar, remarcaram nossas passagens para o dia seguinte.

Passei mais um dia ali, mais um dia comemoração e descoberta, mais uma trama do destino.

Agora livre, com asas soltas, só preciso cumprir algumas obrigações para voar...

-Para lá? Não sei!

Sei que depois de dez anos, agradeci com toda minha gratidão os lugares, os anos e as pessoas que me fizeram ser o que estou sendo.

Bal 2

Um comentário:

Anônimo disse...

Amiga, a vida se transforma e nos transforma em algo muito melhor que só o tempo entende e os corações reconhecem...

Amo-te!

Namastê

Bal1